terça-feira, novembro 16, 2010

génios inúteis

Portugal é (segundo treze ou catorze pessoas que eu questionei à saída da Estação de Queluz-Belas depois de terem passado em simultâneo sem pagar os novos torniquetes para inválidos), o país do mundo que consegue mover mais gente em prol de ideias únicas, simples e completamente inúteis. Se usássemos esta força para algo realmente agente de mudança nas nossas vidas ou na de outros, não teria tanta piada, nem tantos aderentes, nem duraria mais que 5 minutos. Talvez devêssemos olhar para a produtividade lusa como um bolo rei que necessita de ter vinte quilómetros e o menor número possível de ovos indirectamente proporcional ao maior número imaginário de frutas cristalizadas. Talvez devêssemos tentar trazer para discussão pública o fim de leis obsoletas com mais de 30 anos com  mesma genica com que tentamos descer, ao pé coxinho (mais rapidamente-em andas-de costas-dançando funk-todos nús-juntando a maior multidão de bissexuais-folgazões-quarentões de bigode monárquico-trauteando a "Tocata e Fuga")-,os degraus do Bom Jesus. 

Talvez devêssemos discutir com o mesmo afinco a desigualdade social com que discutimos a desigualdade entre Dartacão e o Bocas.

Eu prefiro Bocas. G.F.

sexta-feira, novembro 12, 2010

Adeus Senhor do Adeus

        Talvez seja a primeira vez que fique triste pela morte de um estranho público. Digo público porque aquele que nos acenava era de uma generosidade que, embora anónima, nos afastava do privado e nos fazia sorrir para ele e para a nossa cidade.
        Numa capital onde muitas vezes nos ultrapassamos sem ver caras e onde criamos ideias difusas de multidões associadas a esta ou aquela esquina costumeira, o Senhor do Adeus era alguém que nos trazia familiaridade. Porque não era louco e porque acenava dizendo adeus à sua e à nossa solidão, ele era-nos importante. Era-nos importante porque decidiu estar ali e fazê-lo, repetidamente, dia após dia, ano após ano.
          Há poucas pessoas que se tornam ícones anónimos de uma cidade: o senhor do adeus era, desde há muito tempo, uma estátua viva do Saldanha. Reconhecido de longe, reconhecido em toda a parte. Parei há uns anos, depois de uma ida ao cinema sozinho, junto do Senhor do Adeus, tratando-o como Senhor do Adeus. Falámos sobre cinema e sobre solidão, sobre artrites nas mãos e sobre despedidas. Mais que a conversa guardo a ternura com que muita gente parava o carro e, sem gozar, apenas acenava, apitava, lhe perguntava se precisava de alguma coisa. Gente que sobretudo conduzia sozinha. Ele interrompia a conversa que estava a ter comigo para simplesmente se despedir saudando-os. Como se nunca o tivesse feito na última década vezes sem conta. Espantava-me a sua capacidade de despertar sorrisos de forma tão simples. Às vezes até mesmo a altas horas de madrugada. Sorrisos de pessoas que invariavelmente também faziam parte de noites solitárias alfacinhas e que ali tinham a cumplicidade de um estranho mas tocante aceno.
                Algumas vezes imaginei-o porteiro simpático de quem ia para o reboliço do Marquês, para os hotéis da Liberdade ou para a boémia do Bairro Alto. Parecia que ao dizer-nos adeus nos bem-dizia: “Adeus, façam favor de continuar Lisboa”.
Talvez fosse isso o mais tocante e o que me faz entristecer hoje. É que tal como o fado do Marco Rodrigues que há 3 semanas tinha estado a ouvir, tal como nesse “homem do Saldanha” é cantado: o senhor do adeus não nos dizia adeus, dizia-nos olá. Os que o julgavam louco e troçavam nunca entenderão que este olá nos tocava. Talvez esses precisassem mais dele que nós.
                Vi o Senhor do Adeus a semana passada, à saída do Bairro, no Príncipe Real. Sorrimos por ele continuar ali como que teletransportado do Saldanha tal e qual personagem de um filme que vem só fazer a marcação indelével de um qualquer manifesto. De uma manifesto de coragem quase quixoteana ou simplesmente alguém real que gostava de existir em várias das nossas colinas e de fazer essa entrega à sua cidade, aos seus lisboetas. Disse-lhe da janela “boa noite”, ele sorriu-nos, nós acenámos.
                 Espanta-me que tenha dito mesmo Adeus o Senhor do Adeus. Estou triste porque ele era uma parte da nossa Lisboa que será contada aos mais novos em jeito de lenda urbana. Uma espécie de McDrive onde não era preciso pedir nada por um cumprimento em troca, numa cidade em crescente comprimento e tão afastada de cumprimentos. 
 Gostava que eles soubessem que o Senhor, antes do Adeus, existiu, viveu só e morreu sozinho. Foi humano e o que se escreverá sobre ele ultrapassará o seu singular içar da mão que era apenas o que bastava para prosseguirmos Lisboa.
                Amanhã o Saldanha não será o mesmo Saldanha e nós teremos ainda menos gente que nos diga Adeus como uma despedida deve apenas ser: perfumada com um sorriso e travestida de um ténue travo a "olá de novo".
                Adeus Senhor do Adeus.

quinta-feira, outubro 21, 2010

On rit encore

Bienvenue en mon cirque
Mon cabaret du ridicule
Ce soir, vous faites l’homme fort
Et moi, je joue les funambules

L’homme fort, sachez

Doit d’abord avoir l’air de faire
Un grand effort en silence
Il danse tout seul avec la mort

Nous sommes d’ici

Nous sommes gentils bien sur
Nous sommes plus forts plus forts que la nature nature
Nos avancions rayonnant
D’optimisme et d’amour
Qu’on a tout vu, tout vu
Et on rit encore encore

Et cependant je continue

Moi à risquer ce qui bouge dans mon ventre
Vous êtes si stoïque
Et moi si imprudente

C’est si burlesque

Si pittoresque
L’homme fort et la jeune funambule
Jouant à la cachette dans un hôtel qui brule

Nous sommes d’ici

Nous sommes gentils bien sur
Nous sommes plus forts plus forts que la nature nature
Nous avancions rayonnant
D’optimisme et d’amour
Qu’on a tout vu, tout vu
Et on rit encore encore

Lhasa et Arthur H.

terça-feira, outubro 12, 2010

Adiciona-nos.

Até amanhã se Deus quiser. Se Deus não quiser, que tenha bons argumentos para o seu capricho, porque nós estaremos prontinhos para os desmontar. Afinal pertencemos ao restrito grupo das pessoas que são bonitas, cultas e, acima de tudo, imortais. Adiciona-nos a todos. Somos os do intenso grupo dos que se começaram a ocupar antes do tempo com tal luta. Nunca morreremos até prova em contrário. Mas também não estamos propriamente a querer dizer que queiramos viver para sempre. É nessa ambivalente falsidade em que inventamos canções d’engano e em que nos embebedamos sem ligeirezas de poucas virtudes. Em que criamos por encomenda ao domicílio fados. Meus, nossos ou só teus,  se precisares de um que te dê jeito. Que nos dê jeito. Não tens propriamente algo a que chames domicílio? Tratamos disso. Afinal se nos adicionares somos ou não somos uma equipa?

 Até amanhã se Deus quiser. Se Deus não quiser, laçamos-lhe os sapatos, antes que a madrugada acabe. E olha que ele cairá dignamente como só os deuses sabem tombar. Escuta, vem daí. Estás há quanto tempo aí hospedado? Dias, meses, anos? Vomita a chave, destrepa os lençóis. Faz o check out do Hotel Miséria. Vem a galope, limpa as remelas, escova bem os dentinhos, porque é preciso sorrir muito e estar passivamente agradado com o mundo. Não serás famoso por muito mais tempo, um dia terás a tua quota de 15 minutos de anonimato. Mas não é isso que queremos para ti agora. Queremos-te a galope. Insatisfeito, ambicioso, «empreendedor». Com power pá. Muito power. Vem traz essa força e gasta-te. Amanhã só terá manhãs se Deus quiser não é? Então gasta-te. Usa-te. Abraça-nos. Somos amiguinhos: mais de nós em desgaste só alargará a nossa rede. Aumenta a rede, lança a rede, coze a rede e cose quem não quer ser da  nossa rede. Informa-te. Informa-te de tudo. Vê tudo. Lê tudo. Observa tudo. Experimenta tudo. Não tenhas vergonha. Não tenhas medos. Não te preocupes. Não te assustes. Nunca entristeças. Não pares se Deus quiser. Não pares. Não pares. Não pares jamais.
Cavalga connosco. Vive supersónicamente. Vamos em frente que ainda há muito em que nos gastarmos. Há carne e sonhos para todos. Há tesão e desejos para todas. Vamos ter tudo à grande, tudo à pequena era antigamente quando ainda não eras forte. Agora adiciona-nos. Nós temos a derradeira solução. Tudo é positivo, tudo são soluções. Tudo pode ser gerido. Tudo pode ser balizado. Tudo pode ser atingido sempre.Rompemos  problemas, rompemos cláusulas, rompemos tudo. Até minas, rompemos. Queres romper o quê hoje? 

Deus não há de crer, tranquiliza-te. Relaxa-te. Cultiva-te. Embeleza-te.Tonfica-te. Perfuma-te.Upgrada-te. O amanhã virá de certeza. O teu e o dos teus, por isso não pares. Avança para os teus cavalos novos. Avança para o teu castelo novo. Usa-te dos sinais de  fumo novos, novinhos em montra. Não abrandes, é sempre em frente, um horizonte é apenas sinal do próximo horizonte. Não te traves, experimenta tudo, não tenhas vergonha. Não te desconfortes. Não tenhas dúvidas. Não faças perguntas. Não critiques. Não tenhas medo. Não te preocupes. Não te assustes. Nunca entristeças. Não te embasbaques. Não pares. Só se nós quisermos, a equipa, claro.  Até amanhã se “nós” quisermos. 

Adiciona-nos. Quanto tempo continuarás a "gostar" de nós? G.F.
Porque quer ele ir a Marte se nem imagina quão boa é a água em Trás-os-Montes? G.F.

"No ball games"

Banksy

quinta-feira, outubro 07, 2010

Deus criou as mulheres. (estas também,)

Dez lamúrias por gole

Isto é só um copo eu não bebi demais
Achei que era diferente e são todas iguais
Escrevi canções sobre ela mil noites sem fim
Deixou-me neste bar a cantá-las pra mim
Doce uuu uuuuuu uuuuu
Eu bebo da garrafa tomo o gin de manhã
Se o Príncipe era um sapo ela devia ser rã
Eu amo quem eu sei que não me vai amar
Mas só assim me dá vontade de cantar
Doce uuu uuuuuu uuuuu
 
A dor existe e não dá pra esquecer
O peito insiste e não a deixa morrer
E eu não vou deixar-me beber como gin
E para estar sóbrio não basta só pensar em mim
Oh não
 
Deus não era isto que eu queria ser
O que me deixa mal o que me faz viver
Sinto a roupa fria e o corpo dorido
Sinto o cheiro a vinho mesmo sem ter bebido
Nada
Uuu uuuuuu uuuuu
 
Isto é só um copo a boca já me arde
Um homem varre o chão e diz que já é tarde
Senhor só bonne voyage é hora de fechar
E a Lua é mulher que hoje vou abraçar
Doce uuu uuuuuu uuuuu
 
A dor existe e não dá pra esquecer
O peito insiste e não a deixa morrer
E eu não vou deixar-me beber como gin
E para estar sóbrio não basta só pensar em mim
 
E eu não vou deixar-me beber como gin.

Manuel Cruz

Ó Avó

Ó Avó, tu já foste criança? Porque é que não me deixam chamar-te velha se tu és muito velha? Tens rugas muita velhas, palavras muito velhas, roupas bonitas mas mesmo das velhas, sabes? Tu és velha mas eles não me deixam chamar-te velha. Olha, eu gostava de ser velha. Toda a gente ia tratar de mim e eu não precisava de me mexer muito, só o que eu quisesse. Podia fingir muita bem que era surda só para não me chatearem. Sabes quando eles começam com aquelas conversas? Os outros, os maiores que as crianças, mas sem serem velhos, os do meio da vida? Tu também não gostas não é avó? Avó, o que são “partilhas”? Cada vez que falam da avó falam disso, eu acho que deve ser um doce muita bom que tu fazes no Natal e todos querem lambuzar-se, mas eu estou-me sempre a esquecer o natal passado. Como tu avó! Porque é que não te lembras do meu nome e chamas sempre cinco diferentes antes de acertares? Ó avó, quando eu for também uma velha vou-me esquecer de quando era criança? É por isso que gosto de ti, podemos falar de coisas importantes, como brincadeiras ou só comer rebuçados às escondidas dos meus pais. Ó Avó, ter dentes de plástico é fixe? Quando for uma velha quero ter uma dentes de plástico e se houver quero de vampiros, para assustar os outros velhos! Queres que te dê no próximo natal uns dentes assim? Avó vais estar cá no próximo natal? Também quero comer coisas bué frias ou mesmo bué quentes sem problemas, não ter dentes é tão divertido! Avó, porque é que não preciso de te pedir para contar histórias boas e repetir e repetir? Gosto de ti porque tu estás sempre a repetir tudo. Eu já sei sempre o que vais dizer avó, sempre, e gosto sempre de dizer ao mesmo tempo que tu. Depois, escangalhamo-nos a rir, como tu dizes. O que é escangalhar avó? Toda a gente pode escangalhar ou só quando formos mais grandes?Avó, tens saudades do avô? Eu acho que ele não está no céu porque se tu gostavas dele ele devia estar na terra. A não ser que o avô agora seja uma nuvem em forma de avô ou só em forma de boina do avô como eu vi uma ontem. O meu amigo João disse que a mãe de uma amiga dele disse à prima que os avôs são menos que as avós, porque no céu dos velhos, precisam mais de homens. Eu acho que eles não deviam era precisar de ninguém, mas isso não são coisas para eu me preocupar agora disse-me a minha mãe. Ó avó, tu quando davas beijos no avô, era só na cara? Eu assim também sou velha, não gosto de beijos na boca, canojo! Ó avó, quando davas beijos só na cara do avô ou quando te despedias de pessoas tiravam os chapéus e era tudo a preto e branco? Ó avó, como era a vida a preto e branco? Ó avó tu estás a ficar com os cabelos cinzentos porque os velhos quando ficam velhinhos começam a tornar-se outra vez num filme a preto e branco? Eu não quero ser um filme a preto e branco avó e se fico muda?! Eu acho que os senhores que mandam no céu dos velhos devem por graffiti invisível na vossa cabeça e a outros fazem a barba ao cabelo só para entrarem no céu dos velhos um pouquinho mais compostos. Ó avó, quando compraste a bengala ficaste triste ou fingiste que tinhas comprado uma guitarra e dançaste? Avó, tu viste mesmo dinossauros quando andavas na escola? Como era andar de carroça? Havia pirâmides em Lisboa?Andaste nas guerras avó? Falavas mouro? Tinhas algum amigo rei no teu facebook? Mas se não havia internet nem telemóvel como é que vocês conheciam pessoas novas? Estavam a maior parte do tempo com mesmas?! Como eu estou todos os dias no recreio com a Madalena e a Joana e quando se chateavam vocês também eram obrigados a fazer a paz em vez de ir cada um para seu lado? Avó, o teu cão também falava? Quem me dera que o meu cão falasse avó, às vezes não percebo se ele queria mesmo ir passear! Os cães-avôs quando deixam de existir vão para o céu dos velhos? É que o meu cão gostava tanto do meu avô e o meu cão já tem bisnetos…A minha tia disse no carnaval, que os velhos um dia ficavam senis. O que é senis? É uma cor? É um cheiro de velhinha como tu tens? Porque é que os avós cheiram a avós? A tua casa cheira a avó, o natal cheira a avó, a lareira cheira a avó, os meus beijinhos novos nas tuas ruguinhas velhas cheiram a avó. Ah, senis é esquecidos. Mas avó, se os velhos ficam esquecidos não se vão lembrar que são esquecidos, por isso acho que não há problemas, podes ficar senil, avó que eu vou lembrar-te das coisas que fores perdendo pelo caminho até ires para o céu dos velhos. Avó a partir de que idade tu ficaste uma velha? Eu quando for uma velha vou saber tantas coisas como tu? Eu quando for uma velha vou fazer tantas coisas como tu? Avó, como é que tens paciência para fazer tudo tão devagar. A mim estão-me sempre a dizer: “despacha-te”, vá come, temos de ir; já fizeste os trabalhos? acabou-se a brincadeira!”. Tu não avó! Também quero ser uma velha em câmara lenta como tu mas ter mais força que os mais grandes e mais rápidos da minha rua ou desta auto-estrada que vai para a tua terra. Oh avó, porque é que vives aqui sozinha? Não há casas só para velhos se sentirem sozinhos mas onde podem olhar para outros velhos que se sentem sozinhos? Avó, tu és como uma tartaruga velha que nunca está à espera de qualquer coisa. Tu já viste tudo? Eu ainda não vi quase nada. Avó, quando formos as duas velhas tu vais ter mais de mil anos? O João diz-me que o avô dele, que era polícia, chegou a mais de mil anos. Eu acho que o João pensa que o avô dele é o velho do Senhor dos Anéis mas eu não quis dizer nada para ele não ficar triste. Rapazes, avó, deves ter conhecido alguns… Avó estás a ficar mais pequenina para falares melhor com as crianças? E o teu nariz e as orelhas estão a ficar maiores para puderes ver e cheirar melhor aquelas laranjas. Já agora avó, porque é que na tua terra as pessoas, que são todas velhas como tu, vão ao supermercado e penduram laranjas nas árvores em vez de porem no frigorífico para depois comerem? Avó, porque é que te levantas mais cedo que todas as pessoas no mundo, és tu que ligas o sol? Eu não conto a ninguém avó. Ó avó já adormeceste, espera aí, conta-me outra vez, como é que tu já foste mesmo uma criança?G.F.

Neste blog não fumes.

                                                    G.Brecht

quarta-feira, setembro 29, 2010

blues do sertão

Tudo em vorta é só beleza
Sol de Abril e a mata em frô
Mas Assum Preto, cego dos óio
Num vendo a luz, ai, canta de dor (bis)


Tarvez por ignorança
Ou mardade das pió
Furaro os óio do Assum Preto
Pra ele assim, ai, cantá de mió (bis)


Assum Preto veve sorto
Mas num pode avuá
Mil vez a sina de uma gaiola
Desde que o céu, ai, pudesse oiá (bis)


Assum Preto, o meu cantar
É tão triste como o teu
Também roubaro o meu amor
Que era a luz, ai, dos óios meus
Também roubaro o meu amor
Que era a luz, ai, dos óios meus.


Luís Gonzaga/Humberto Teixeira , 1950

"Fritz the Cat" days

terça-feira, setembro 28, 2010

Cagada em Três Actos I

Quando éramos putos, antes de termos ganho um hipotético gosto adulto-requintado, éramos bem-dispostos e havia filmes que até não nos importávamos de pagar multa no videoclube só para assistir mais uma vez. Não precisávamos de grandes conceitos. Basicamente queríamos porrada, mistérios e amor em doses “puto-herói-David-mata-Golias-e-beija-na-boca-(sem-língua)-a-mais-bonita-do-liceu”. 

Quando eu via estes filmes o meu pai ria-se, dizendo-me: «Cagada em três actos, sabes o que é isto? Uma cagada em três actos!» Eu sempre me diverti com a expressão. Na verdade, quem teve a sorte de nascer nos anos 80 assistiu a um número infindável de cagadas em três actos. 

Gostaria de rever convosco uma das maiores que se tornaram parte da minha infância… O filme chama-se “Fúria Sangrenta” que como todos sabemos traduzido para inglês é “BloodSport” de 1988. Protagonista: João Cláudio da Dama, um dos melhores artistas bruxelenses nascidos no seio das competições de bodybuilding. Este é o filme que o fez rebentar nos Estados Unidos e pelo lirismo da cena final épica podemos todos perceber porque é que o mundo ocidental e oriental se rendeu à sua arte e engenho. Infelizmente, o nosso herói que fez ballet durante 5 anos e foi Mister Bélgica, não ganhou o Óscar nesse ano. 

A trama não é complicada mas original... Um ringue ilegal numa competição secreta chamada Kumite, lutas até à morte por eliminação, treinos duros durante todo o filme até ao combate final. O que poucos sabem é que este é um filme baseado em factos verídicos, é a biopsia de Frank Dux. A verosimilhança, aliás é um dos principais ingredientes ao longo desta fita. 

Nesta última cena, final dramático, não se vêm a quantidade de tijolos partidos com ajuda de apenas lenços molhados e duras articulações dos membros. Também não surge a ameaça do arquirival de João Cláudio, (o Chinês que abana os peitorais): “Cuidadinho, os tijolos não te batem de volta”! Nem tão pouco uma das cenas mais sangrentas da minha juventude a seguir à lesão em directo sofrida pelo Rui Águas do Benfica contra o Dínamo de Kiev. Essa cena em que o grande amigo de João Cláudio fractura explicitamente a perna em resultado do golpe baixo do chinês que mexe as mamocas, cafageste imensurável que é este mega arqui-rival, um actor asiático chamado… Bolo. Sim, Bolo. Bolo Yeung.

A genialidade deste filme também assenta na diversidade. Para chegarem à finalíssima os nossos homens tiveram de derrotar/matar, entre outros um lutador de sumo, um lutador das polinésias e um mexicano. O nosso amigo João Cláudio fá-lo, aliás, com uma perna às costas, ou duas a fazer espargata em bancos chineses. Aliás chega a bater o recorde de vitórias de Bolo Yeung, facto esse que este chinês, de mamilos com vontade própria recalca em si, até ao derradeiro combate…
Bom estou a dispersar-me nos requintes desta produção. O que interessa mesmo é a cena final. Analisemos apenas recorrendo à imagem e a conceitos soltos. Por ordem cronológica: 

-cabelo polido de João Cláudio, em ringue, o aprumo é importantíssimo.
- mamocas malévolas dançantes.

- FRASE QUE MARCA O FILME: a tal que estava recalcada depois do record batido: «you break my record, now i break you like i did to your friend». (Quando queríamos ser maus nos anos 90 repetíamos isto e toda a gente nos tinha respeito. Especialmente quando imitávamos até a perfeição quer o tom, quer o apontar para o joelho com o lenço harley davidson roubado, quer especialmente a espécie de dobragem que o próprio actor ou o sonoplasta do filme fizeram. Algo que conseguiu maravilhar-me durante anos esta mescla de ventriloquismo exótico e artes marciais)

- vilão que exala ranho como o Cristiano Ronaldo
- pontapé que nitidamente não bate na cara de ninguém e som que é de tudo menos de um pontapé.
- árbitro agarrado e empurrado pelo vilão mas usado como catadupa pelo herói. (Remake/Plágio do Mockumentary “José Pratas VS FCPorto”)
-linguagem gestual de como quem diz, as minhas mamocas não estão a mexer, estou fulo contigo João Cláudio, chiça.
- pontapés de João Cláudio no ar mas com som
- minuto 1.37- "eh pá precisamos aqui de um preto qualquer para actor secundário, escolham aquele que provavelmente nunca ganhará nada na vida o...o Forest Whitaker…
- chinês de óculos à paco bandeira muito ansiosozinho
- publico que grita desconjuntadamente "KUMITE"
- Câmara lenta de João Cláudio. Raiva de João Cláudio.
- chinês parece que acabou de sair do mar e tem água no ouvido direito. Incorpora o demónio e ataca.
- João Cláudio também incorpora o Diabo
- serie de 23 socos e pontapés em que nenhum acerta. Nenhum.

- auge da cena: Bolo tira cocaína da zona testicular dos calções e lança -a nos olhos de João Cláudio. A forma como o nosso bruxelense reage ao cegar é motivo "per se "para um Óscar. Vi isto mais de 10 vezes quando tinha tempo livre, ou seja na época de exames da faculdade.
- 3.45: único murro no ar verosímil.
- saltos panisguinhas de vitória de Bolo Yeung
- o drama, a tragédia, a cegueira e belzebu em João Cláudio
- flashbacks dos treinos (plágio de tsubasa)
- João Cláudio apalpa árbitro reconhecendo-o….suspeito...
- Cego, joão cláudio, acerta mais pontapés que vendo.
- JOÃO CLÁUDIO CEGO VENCE DEPOIS DE TRIPLA PATADA. 
- OS BONS E CEGUINHOS VENCEM OS MAUS QUE MEXEM AS MAMAS.uma, digam-me uma alegoria da vida, do mundo, das relações, melhor que esta? G.F.



É preciso voltares a por o pé no pedal. Subires a rampa. Continuares a pasmar-te. Só se os teus outros mundos  te forem ainda admiráveis, poderás ter, aqui e além, alguma vida. É necessário desenganchares o travão. Desceres a rampa e acreditares que depois do salto e da queda há meia dúzia de colchões, esponjas, sorrisos, almofadas a dar-te amparo. É imprescindível que te embasbaques. Comigo, contigo, com o que ainda restar da imaturidade entre todos. G.F.

À quoi ça sert l'amour

Guerra


Hoje ocupei as minhas mãos contigo. Foi para te sentir a pretensa perigosidade. Sentir que, de certa forma, ainda consigo ser o teu inimigo e que tu continuas a gostar da nossa guerra.  Não, não pecas por gostar de batalhas, nem pecas por ansiar ser vencida mais uma vez. Nunca pecas e isso desmascara-me a santidade. Faz-me nunca ter uma bandeira branca sobresselente. Sem tréguas, nas tuas trevas precisas que te faça nascer um incêndio. Precisas que alguém te adivinhe os rastilhos. Tens vários. Para cada uma de ti soldada nunca haverá um só alquimista, embora cada um de nós ache que encontrou a fórmula secreta da tua paz. Hoje ocupas-te a riscar falsos tratados. A rasgar montes de letras onde irámos o que desdenhávamos um do outro. A guerra é guerra. Nenhum de nós tem fé em convenções. Matámo-nos, morremos em glória derramada nos nossos corpos. Pequenos heróis, grandes covardes. A guerra é a guerra e hoje que te ocupo, não te vais poder exilar. G.F.

Times, they are not changing...

 



Ciganos em Belzec Camp, Polónia Alemã 1942



 
Propaganda Política "Lega Nord", Itália, 2003        Propaganda Política "Forza Nuova", 2004


                                                       França, 2010

ChildPubMantra II

Se depois de 3 dias de festivais ainda fores dançar muximas a um domingo e ainda depois te vires em discotecas manhosas, lembra-te do que as batatas fritas te diziam:
«Até que idade pensas divertir-te?»G.F.

ChildPubMantra I

«Se ao fim do dia te sentes cansado, procura um amigo, que a casa te acompanhará» G.F.

Regresso


 Voltei a este blogue. Não sei bem porquê ou pior, temo saber demasiado bem. Como podem ver os comentários foram todos apagados. Não que eu quisesse. Culpem os fazedores de sites e destas geringonças. Tenho esses antigos comentários todos guardados: se algum de vós, parte destes 7 anos de blogue, os quiser rever, basta dizer. Comentem ou voltem a comentar ou abstenham-se. Eu gosto mais de ler mails. Ler, porque responder, raramente. Perdoem-me por favor por isso. O meu mail continua a ser o mesmo, o mail das escritas digo: basbaque@portugalmail.pt. Manifestem-se, digam que passaram por aqui. Gosto de saber que há alguém ai, a tentar também ler mais um regresso meu, ou a ler palavras de quando ainda tinha menos 7 anos. Gosto especialmente que aqui parem os meus amigos e amigas, e aqueles estranhos anónimos que ainda só não são amigos apenas devido ao desconhecimento mútuo. Gosto sobretudo que isto não seja o Facebook. Boa noite. G.F.