quinta-feira, outubro 21, 2010

On rit encore

Bienvenue en mon cirque
Mon cabaret du ridicule
Ce soir, vous faites l’homme fort
Et moi, je joue les funambules

L’homme fort, sachez

Doit d’abord avoir l’air de faire
Un grand effort en silence
Il danse tout seul avec la mort

Nous sommes d’ici

Nous sommes gentils bien sur
Nous sommes plus forts plus forts que la nature nature
Nos avancions rayonnant
D’optimisme et d’amour
Qu’on a tout vu, tout vu
Et on rit encore encore

Et cependant je continue

Moi à risquer ce qui bouge dans mon ventre
Vous êtes si stoïque
Et moi si imprudente

C’est si burlesque

Si pittoresque
L’homme fort et la jeune funambule
Jouant à la cachette dans un hôtel qui brule

Nous sommes d’ici

Nous sommes gentils bien sur
Nous sommes plus forts plus forts que la nature nature
Nous avancions rayonnant
D’optimisme et d’amour
Qu’on a tout vu, tout vu
Et on rit encore encore

Lhasa et Arthur H.

terça-feira, outubro 12, 2010

Adiciona-nos.

Até amanhã se Deus quiser. Se Deus não quiser, que tenha bons argumentos para o seu capricho, porque nós estaremos prontinhos para os desmontar. Afinal pertencemos ao restrito grupo das pessoas que são bonitas, cultas e, acima de tudo, imortais. Adiciona-nos a todos. Somos os do intenso grupo dos que se começaram a ocupar antes do tempo com tal luta. Nunca morreremos até prova em contrário. Mas também não estamos propriamente a querer dizer que queiramos viver para sempre. É nessa ambivalente falsidade em que inventamos canções d’engano e em que nos embebedamos sem ligeirezas de poucas virtudes. Em que criamos por encomenda ao domicílio fados. Meus, nossos ou só teus,  se precisares de um que te dê jeito. Que nos dê jeito. Não tens propriamente algo a que chames domicílio? Tratamos disso. Afinal se nos adicionares somos ou não somos uma equipa?

 Até amanhã se Deus quiser. Se Deus não quiser, laçamos-lhe os sapatos, antes que a madrugada acabe. E olha que ele cairá dignamente como só os deuses sabem tombar. Escuta, vem daí. Estás há quanto tempo aí hospedado? Dias, meses, anos? Vomita a chave, destrepa os lençóis. Faz o check out do Hotel Miséria. Vem a galope, limpa as remelas, escova bem os dentinhos, porque é preciso sorrir muito e estar passivamente agradado com o mundo. Não serás famoso por muito mais tempo, um dia terás a tua quota de 15 minutos de anonimato. Mas não é isso que queremos para ti agora. Queremos-te a galope. Insatisfeito, ambicioso, «empreendedor». Com power pá. Muito power. Vem traz essa força e gasta-te. Amanhã só terá manhãs se Deus quiser não é? Então gasta-te. Usa-te. Abraça-nos. Somos amiguinhos: mais de nós em desgaste só alargará a nossa rede. Aumenta a rede, lança a rede, coze a rede e cose quem não quer ser da  nossa rede. Informa-te. Informa-te de tudo. Vê tudo. Lê tudo. Observa tudo. Experimenta tudo. Não tenhas vergonha. Não tenhas medos. Não te preocupes. Não te assustes. Nunca entristeças. Não pares se Deus quiser. Não pares. Não pares. Não pares jamais.
Cavalga connosco. Vive supersónicamente. Vamos em frente que ainda há muito em que nos gastarmos. Há carne e sonhos para todos. Há tesão e desejos para todas. Vamos ter tudo à grande, tudo à pequena era antigamente quando ainda não eras forte. Agora adiciona-nos. Nós temos a derradeira solução. Tudo é positivo, tudo são soluções. Tudo pode ser gerido. Tudo pode ser balizado. Tudo pode ser atingido sempre.Rompemos  problemas, rompemos cláusulas, rompemos tudo. Até minas, rompemos. Queres romper o quê hoje? 

Deus não há de crer, tranquiliza-te. Relaxa-te. Cultiva-te. Embeleza-te.Tonfica-te. Perfuma-te.Upgrada-te. O amanhã virá de certeza. O teu e o dos teus, por isso não pares. Avança para os teus cavalos novos. Avança para o teu castelo novo. Usa-te dos sinais de  fumo novos, novinhos em montra. Não abrandes, é sempre em frente, um horizonte é apenas sinal do próximo horizonte. Não te traves, experimenta tudo, não tenhas vergonha. Não te desconfortes. Não tenhas dúvidas. Não faças perguntas. Não critiques. Não tenhas medo. Não te preocupes. Não te assustes. Nunca entristeças. Não te embasbaques. Não pares. Só se nós quisermos, a equipa, claro.  Até amanhã se “nós” quisermos. 

Adiciona-nos. Quanto tempo continuarás a "gostar" de nós? G.F.
Porque quer ele ir a Marte se nem imagina quão boa é a água em Trás-os-Montes? G.F.

"No ball games"

Banksy

quinta-feira, outubro 07, 2010

Deus criou as mulheres. (estas também,)

Dez lamúrias por gole

Isto é só um copo eu não bebi demais
Achei que era diferente e são todas iguais
Escrevi canções sobre ela mil noites sem fim
Deixou-me neste bar a cantá-las pra mim
Doce uuu uuuuuu uuuuu
Eu bebo da garrafa tomo o gin de manhã
Se o Príncipe era um sapo ela devia ser rã
Eu amo quem eu sei que não me vai amar
Mas só assim me dá vontade de cantar
Doce uuu uuuuuu uuuuu
 
A dor existe e não dá pra esquecer
O peito insiste e não a deixa morrer
E eu não vou deixar-me beber como gin
E para estar sóbrio não basta só pensar em mim
Oh não
 
Deus não era isto que eu queria ser
O que me deixa mal o que me faz viver
Sinto a roupa fria e o corpo dorido
Sinto o cheiro a vinho mesmo sem ter bebido
Nada
Uuu uuuuuu uuuuu
 
Isto é só um copo a boca já me arde
Um homem varre o chão e diz que já é tarde
Senhor só bonne voyage é hora de fechar
E a Lua é mulher que hoje vou abraçar
Doce uuu uuuuuu uuuuu
 
A dor existe e não dá pra esquecer
O peito insiste e não a deixa morrer
E eu não vou deixar-me beber como gin
E para estar sóbrio não basta só pensar em mim
 
E eu não vou deixar-me beber como gin.

Manuel Cruz

Ó Avó

Ó Avó, tu já foste criança? Porque é que não me deixam chamar-te velha se tu és muito velha? Tens rugas muita velhas, palavras muito velhas, roupas bonitas mas mesmo das velhas, sabes? Tu és velha mas eles não me deixam chamar-te velha. Olha, eu gostava de ser velha. Toda a gente ia tratar de mim e eu não precisava de me mexer muito, só o que eu quisesse. Podia fingir muita bem que era surda só para não me chatearem. Sabes quando eles começam com aquelas conversas? Os outros, os maiores que as crianças, mas sem serem velhos, os do meio da vida? Tu também não gostas não é avó? Avó, o que são “partilhas”? Cada vez que falam da avó falam disso, eu acho que deve ser um doce muita bom que tu fazes no Natal e todos querem lambuzar-se, mas eu estou-me sempre a esquecer o natal passado. Como tu avó! Porque é que não te lembras do meu nome e chamas sempre cinco diferentes antes de acertares? Ó avó, quando eu for também uma velha vou-me esquecer de quando era criança? É por isso que gosto de ti, podemos falar de coisas importantes, como brincadeiras ou só comer rebuçados às escondidas dos meus pais. Ó Avó, ter dentes de plástico é fixe? Quando for uma velha quero ter uma dentes de plástico e se houver quero de vampiros, para assustar os outros velhos! Queres que te dê no próximo natal uns dentes assim? Avó vais estar cá no próximo natal? Também quero comer coisas bué frias ou mesmo bué quentes sem problemas, não ter dentes é tão divertido! Avó, porque é que não preciso de te pedir para contar histórias boas e repetir e repetir? Gosto de ti porque tu estás sempre a repetir tudo. Eu já sei sempre o que vais dizer avó, sempre, e gosto sempre de dizer ao mesmo tempo que tu. Depois, escangalhamo-nos a rir, como tu dizes. O que é escangalhar avó? Toda a gente pode escangalhar ou só quando formos mais grandes?Avó, tens saudades do avô? Eu acho que ele não está no céu porque se tu gostavas dele ele devia estar na terra. A não ser que o avô agora seja uma nuvem em forma de avô ou só em forma de boina do avô como eu vi uma ontem. O meu amigo João disse que a mãe de uma amiga dele disse à prima que os avôs são menos que as avós, porque no céu dos velhos, precisam mais de homens. Eu acho que eles não deviam era precisar de ninguém, mas isso não são coisas para eu me preocupar agora disse-me a minha mãe. Ó avó, tu quando davas beijos no avô, era só na cara? Eu assim também sou velha, não gosto de beijos na boca, canojo! Ó avó, quando davas beijos só na cara do avô ou quando te despedias de pessoas tiravam os chapéus e era tudo a preto e branco? Ó avó, como era a vida a preto e branco? Ó avó tu estás a ficar com os cabelos cinzentos porque os velhos quando ficam velhinhos começam a tornar-se outra vez num filme a preto e branco? Eu não quero ser um filme a preto e branco avó e se fico muda?! Eu acho que os senhores que mandam no céu dos velhos devem por graffiti invisível na vossa cabeça e a outros fazem a barba ao cabelo só para entrarem no céu dos velhos um pouquinho mais compostos. Ó avó, quando compraste a bengala ficaste triste ou fingiste que tinhas comprado uma guitarra e dançaste? Avó, tu viste mesmo dinossauros quando andavas na escola? Como era andar de carroça? Havia pirâmides em Lisboa?Andaste nas guerras avó? Falavas mouro? Tinhas algum amigo rei no teu facebook? Mas se não havia internet nem telemóvel como é que vocês conheciam pessoas novas? Estavam a maior parte do tempo com mesmas?! Como eu estou todos os dias no recreio com a Madalena e a Joana e quando se chateavam vocês também eram obrigados a fazer a paz em vez de ir cada um para seu lado? Avó, o teu cão também falava? Quem me dera que o meu cão falasse avó, às vezes não percebo se ele queria mesmo ir passear! Os cães-avôs quando deixam de existir vão para o céu dos velhos? É que o meu cão gostava tanto do meu avô e o meu cão já tem bisnetos…A minha tia disse no carnaval, que os velhos um dia ficavam senis. O que é senis? É uma cor? É um cheiro de velhinha como tu tens? Porque é que os avós cheiram a avós? A tua casa cheira a avó, o natal cheira a avó, a lareira cheira a avó, os meus beijinhos novos nas tuas ruguinhas velhas cheiram a avó. Ah, senis é esquecidos. Mas avó, se os velhos ficam esquecidos não se vão lembrar que são esquecidos, por isso acho que não há problemas, podes ficar senil, avó que eu vou lembrar-te das coisas que fores perdendo pelo caminho até ires para o céu dos velhos. Avó a partir de que idade tu ficaste uma velha? Eu quando for uma velha vou saber tantas coisas como tu? Eu quando for uma velha vou fazer tantas coisas como tu? Avó, como é que tens paciência para fazer tudo tão devagar. A mim estão-me sempre a dizer: “despacha-te”, vá come, temos de ir; já fizeste os trabalhos? acabou-se a brincadeira!”. Tu não avó! Também quero ser uma velha em câmara lenta como tu mas ter mais força que os mais grandes e mais rápidos da minha rua ou desta auto-estrada que vai para a tua terra. Oh avó, porque é que vives aqui sozinha? Não há casas só para velhos se sentirem sozinhos mas onde podem olhar para outros velhos que se sentem sozinhos? Avó, tu és como uma tartaruga velha que nunca está à espera de qualquer coisa. Tu já viste tudo? Eu ainda não vi quase nada. Avó, quando formos as duas velhas tu vais ter mais de mil anos? O João diz-me que o avô dele, que era polícia, chegou a mais de mil anos. Eu acho que o João pensa que o avô dele é o velho do Senhor dos Anéis mas eu não quis dizer nada para ele não ficar triste. Rapazes, avó, deves ter conhecido alguns… Avó estás a ficar mais pequenina para falares melhor com as crianças? E o teu nariz e as orelhas estão a ficar maiores para puderes ver e cheirar melhor aquelas laranjas. Já agora avó, porque é que na tua terra as pessoas, que são todas velhas como tu, vão ao supermercado e penduram laranjas nas árvores em vez de porem no frigorífico para depois comerem? Avó, porque é que te levantas mais cedo que todas as pessoas no mundo, és tu que ligas o sol? Eu não conto a ninguém avó. Ó avó já adormeceste, espera aí, conta-me outra vez, como é que tu já foste mesmo uma criança?G.F.

Neste blog não fumes.

                                                    G.Brecht